SEUL, CORÉIA DO SUL (FOLHAPRESS) – Menos de 24 horas depois do anúncio da lei marcial na Coreia do Sul pelo presidente Yoon Suk Yeol e de seu posterior recuo, vigílias se espalharam pelo país na noite de quarta-feira (4), horário local. A principal delas, acompanhada pela Folha, se posicionou diante da Assembleia Nacional, em Seul, prédio que tropas militares tentaram invadir na noite anterior.

Questionada por que estava ali, uma jovem respondeu: “Para lutar! Para lutar!”. Pela democracia, acrescentou depois. Gook Hee Ko, 28, é atriz e atravessou a madrugada assistindo em vídeo às cenas no entorno e dentro do Legislativo, que acabou votando por unanimidade contra a lei marcial, retirada então por Yoon.

Ficaram ela e uma amiga, a programadora Eulji Kim, também 28, conversando por mensagem “a noite toda”. Também com suas famílias. “Meu irmão é policial, falou que era muito perigoso e sério aqui, aconselhou que eu fosse para nossa cidade natal”, disse Kim, que não foi e decidiu ficar na vigília na Assembleia.

“Nós estávamos com tanta, tanta raiva”, declarou ela. “Como ele [Yoon] fez isso? E a razão que deu no anúncio [combater comunistas]? Nós achamos que ele é tão estúpido. Trata as pessoas como se elas não pensassem. Quero que ele saia pacificamente. Quero ele seja impedido.”

Minutos antes, questionado do outro lado da manifestação, Youngbyeok Kim, também 28, disse que decidiu participar por causa do anúncio de Yoon. “Eu achava que isso era coisa de muito tempo atrás na Coreia. Era uma ditadura, eram ditadores. Como pode ser a mesma situação em 2024? Então eu vim aqui.”

Ele trabalha num escritório com vista para a Assembleia. Mostrou onde estavam as janelas quebradas pelos soldados enviados pelo presidente para impedir uma reação dos parlamentares. “Eles [soldados] eram muito jovens e não queriam ser violentos”, diz.

“Mas são militares. Militares não podem vir aqui no Parlamento. Foi muito, muito sério. Eles tentaram capturá-los para evitar que votassem para parar a lei marcial. Quebraram janelas. Nem sabiam o que fazer. O povo coreano não apoia isso. Só uns 10%. Todos no Parlamento votaram contra.”

Ele também quer o impeachment de Yoon e diz que “vai ser fácil” —a oposição, porém, tem 192 dos 200 votos necessários para aprovar a destituição, ou seja, seria necessário que 8 parlamentares governistas se voltassem contra o presidente. O esforço do governo sul-coreano nesta quarta, oferecendo a demissão do ministro da Defesa para estancar a pressão, não repercutiu entre os manifestantes. O alvo é Yoon.

Um economista de 27 anos, que pediu para não ter o nome citado porque está começando num cargo público, deu razão parecida para estar na vigília. Disse que odeia Yoon e citou a primeira-dama, Kim Keon-hee, envolvida em suspeita de corrupção por ter recebido uma bolsa Christian Dior no valor de cerca de 3 milhões de wons (cerca de R$ 11 mil) de um pastor.

Disse que nunca participou de protestos assim, mas não podia ficar parado depois do que viu na terça. Mas não pôs a culpa nos soldados, que, segundo ele, não invadiram o Congresso por vontade própria. Para este manifestante, as vigílias não são partidárias.

De estudantes a uma cantora lírica, o revezamento diante da multidão era constante para mobilizar reações, cada manifestante sentando na escadaria balançando uma pequena bandeira em meio ao frio, gritando bordões levantados pelos oradores.

Quando a reportagem deixou a vigília, por volta de 20h (8h de Brasília), fazia 1ºC, com a previsão anunciando que a temperatura logo estaria negativa. Mas o fluxo de gente só aumentava, com grupos de jovens e famílias, inclusive crianças, chegando para se incorporar à manifestação.