BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Manuscritos do ex-ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno, apreendidos pela Polícia Federal indicam que o governo Jair Bolsonaro (PL) avaliou usar a AGU (Advocacia-Geral da União) para impedir operações policiais consideradas pela própria administração como ilegais.
O objetivo, segundo a PF, seria impedir que a corporação pudesse “exercer seus deveres constitucionais, no cumprimento de determinações judiciais contra seu grupo político e apoiadores”.
As anotações estavam em um caderno da Caixa encontrado na casa do general durante buscas da PF. O texto dizia que o Ministério da Justiça deveria acionar a AGU antes de cumprir decisões judiciais para conferir a legalidade da ação.
“Se o MJ acionar a AGU caráter de urgência sobre ordem judicial manifestamente ilegal o AGU faz um texto fundamentado na Const Federal afirmando sobre ordem ilegal. Existe um princípio de direito que ordem manifestamente ilegal não se cumpre”, diz o texto.
Os manuscritos de Augusto Heleno dizem que o presidente da República teria papel para aprovar as manifestações da AGU. “Quem executar a ordem ilegal comete crime de responsabilidade”, escreveu o ex-ministro, destacando em seguida a “prisão em flagrante do delegado que se dispuser a cumprir”.
Há diversos trechos no texto que não são muito claros sobre sua relação com o tema. Heleno, por exemplo, escreveu um tópico de que a “autoridade vai se dirigir às FA”, provavelmente em referência às Forças Armadas.
As buscas realizadas pela PF ainda encontraram documentos produzidos pelo ex-diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) Alexandre Ramagem.
Em possível relação com os manuscritos de Heleno, um documento produzido por Ramagem diz que a corregedoria da PF poderia pedir parecer da AGU em eventuais suspeitas de cumprimento de decisões ilegais.
“Em todos os casos, um parecer técnico-jurídico [da AGU] darão (sic) suporte para apontar violações constitucionais e legais. Os pareceres respaldarão o não atendimento de medidas judiciais por estarem manifestamente contrárias à lei”, escreve Ramagem.
De acordo com a Polícia Federal, as anotações de Heleno descrevem uma “comunhão de esforços” no governo Bolsonaro para dar poderes à AGU para definir quais decisões judiciais seriam legais.
“Os elementos de prova não deixam dúvidas de que a organização criminosa estava elaborando estudos para de alguma forma tentar coagir integrantes dos sistema de persecução penal para que as investigações contra seus integrantes fossem cessadas”, diz a PF.
Em outra página, o ex-ministro destaca pontos relacionados à segurança institucional. Entre os oito pontos listados, Heleno dá destaque a “limiar do rompimento” e “jogar nas quatro linhas”.
Augusto Heleno também escreve no caderno outras diretrizes estratégicas que seriam repassadas a Bolsonaro sobre como se comportar em meio aos ataques às urnas eletrônicas.
Ele diz para se fazer um “levantamento das áreas onde o Pres possui aliados confiáveis”. Orienta a “não fazer qualquer referência a homossexuais, negros, maricas, etc” e “evitar comentários desairosos e generalistas sobre o povo brasileiro”.
“Estabelecer um discurso sobre urnas eletrônicas e votações. É válido continuar a criticar a urna eletrônica.”
Augusto Heleno e Ramagem foram indicados pela Polícia Federal pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado e organização criminosa, cujas penas somam de 12 a 28 anos de prisão, desconsiderando os agravantes.