BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Brasil registrou saída recorde de dólares pela via financeira entre janeiro e outubro e totalizou um saldo líquido negativo de US$ 56,21 bilhões no acumulado do ano, segundo dados do Banco Central divulgados nesta segunda-feira (25).

Esse foi o pior desempenho do fluxo financeiro no período desde o início da série histórica do BC, iniciada em 1982. A cifra já supera o resultado da conta financeira do câmbio contratado em 2020 –ano marcado pelos efeitos da pandemia de Covid–, quando houve saldo negativo de US$ 55,36 bilhões no mesmo intervalo.

O fluxo financeiro está relacionado à entrada e saída de dólares no mercado de capitais, com operações referentes a, por exemplo, investimentos em títulos, remessas de lucros e dividendos no exterior e investimentos estrangeiros diretos.

De acordo com o chefe do departamento de estatísticas do BC, Fernando Rocha, a redução nos ingressos de capitais estrangeiros pelo mercado de câmbio doméstico é o fator principal que puxa o aumento das saídas líquidas de dólar do país pela conta financeira.

“Nós tivemos, no caso dos capitais estrangeiros, que são aqueles capitais de investimento direto, ações, renda fixa, empréstimos e outros, uma redução maior. Eles somaram R$ 54,8 bilhões de janeiro e outubro do ano passado e agora foram R$ 31 bilhões nesse ano, ou seja, houve um ingresso líquido menor”, disse.

“A gente tem tido, no caso do portfólio, saídas líquidas em ações que diminuem o total investido no país e contribuem para diminuir o total desses fluxos também”, acrescentou.

Considerando o envio sazonal de recursos para o exterior nos últimos meses do ano, sobretudo no mês de dezembro, a tendência é que, em 2024, o fluxo financeiro registre a maior saída de dólares da história. Em 2019, a fuga foi de US$ 65,8 bilhões.

Segundo Rocha, as contas no balanço de pagamentos mostram que as subsidiárias remetem lucros às matrizes no exterior em maior quantidade nessa época do ano.

“Mas também existem remessas maiores em outras rubricas do balanço de pagamentos que acontecem no mês de dezembro e a gente vê esse reflexo no mercado de câmbio, pagamentos de dívidas e outros que têm uma sazonalidade em dezembro”, acrescenta.

Ele projeta que essa tendência volte a se repetir. “A gente viu isso em dezembro ao longo dos últimos vários anos. Então se deve esperar que aconteça isso também em dezembro deste ano”, diz.

Apesar da saída expressiva de dólares da conta financeira, o fluxo cambial segue positivo no acumulado de janeiro a outubro pela entrada superior de recursos pela via comercial. No mês passado, a balança comercial de bens registrou superávit de US$ 3,4 bilhões.

Dados do BC também mostraram que o Brasil apresentou um déficit em transações correntes do balanço de pagamentos de US$ 5,88 bilhões em outubro, contra um superávit de US$ 451 milhões no mesmo mês de 2023.

De acordo com o chefe do departamento de Estatísticas, mais de 80% desse resultado deve-se à redução no superávit comercial de bens. Ele afirma que, enquanto as exportações mostraram estabilidade em um patamar bastante elevado (o valor exportado chegou a US$ 286,9 bilhões no acumulado de janeiro a outubro e bateu o recorde da série), as importações têm aumentado.

“Nós estamos com fluxos na balança comercial, tanto de exportações como de importações elevados, aumentando a corrente de comércio do país, o que pode ser interpretado como uma coisa positiva, mas uma dinâmica maior nas importações, que reduz o superávit comercial e tem a ver com o próprio dinamismo interno da economia brasileira”, afirma Rocha.

Os investimentos diretos no país alcançaram US$ 5,7 bilhões em outubro, acima dos US$ 3,1 bilhões na comparação interanual, conforme dados do BC.

A autoridade monetária também revisou o resultado das contas externas. Para 2023, o déficit em transações correntes subiu de US$ 21,7 bilhões (1% do PIB) para US$ 24,5 bilhões (1,13% do PIB). De acordo com o BC, essa revisão decorreu principalmente da variação na renda primária, cujo déficit saltou de US$ 76,5 bilhões para US$ 79,5 bilhões.

Já no acumulado de janeiro a setembro deste ano, o déficit foi revisado de US$ 37,3 bilhões para US$37,7 bilhões, decorrente da atualização dos valores referentes à balança comercial de bens, compilados pela Secex (Secretaria de Comércio Exterior).