SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As ações na Justiça do Trabalho que envolvem discriminação por idade tiveram aumento expressivo nos últimos seis anos, segundo levantamento do escritório Trench Rossi e Watanabe. Em 2017, havia no Judiciário 12 processos sobre etarismo ante 403 em 2023, alta de mais de 3.000%.

A projeção é que 2024 encerre com 450 processos do tipo. O valor total das causas até setembro deste ano chegou a R$ 79,6 milhões. Em 2023, ficou em R$ 174,64 milhões, número bem maior do que o R$ 1,57 milhão registrado há seis anos.

O ano de 2017 marca a aprovação da reforma trabalhista, que fez alterações nas regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) envolvendo, além de profissionais de todas as áreas, a Justiça do Trabalho. Houve limitação para o ingresso de ações, mas a judicialização segue em alta.

Com isso, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) aprovou, no final de setembro deste ano, resolução que permite acordos extrajudiciais sem que seja necessário entrar com ação.

O levantamento do Trench Rossi Watanabe é feito por meio da plataforma Data Lawyer, que tem como base processos no Judiciário trabalhista desde 2014, quando começou a informatização dos sistemas.

Os dados mostram ainda que, entre 2017 e 2021, foram contabilizados 71 processos envolvendo etarismo. Em 2022, o número saltou para 78 e, em 2023, houve o recorde de 403 ações.

Até setembro deste ano, há 340 casos discutindo etarismo em tribunais regionais e no próprio TST (Tribunal Superior do Trabalho).

Para a advogada Priscila Kirchhoff, sócia da área trabalhista do escritório, os conflitos de geração podem explicar essa explosão de casos. Hoje, há cerca de seis gerações convivendo no mercado de trabalho, o que aumentaria a discriminação.

Outro fator a ser considerado é o de que, após o Estatuto do Idoso, que passou a valer em 2003, a conscientização sobre esses abusos ficou maior. O convívio entre gerações, porém, traz ainda mais desafios para as empresas.

No TST, o primeiro processo reconhecendo discriminação por idade é de 2003. Na ocasião, a empresa havia sido condenada a readmitir trabalhador e recorreu ao tribunal contra a decisão. O recurso foi negado sobe a alegação de que a lei 9.029, de 1995, proíbe práticas discriminatórias no mercado de trabalho, seja por cor, raça ou idade, entre outros.

Na época, o termo etarismo ainda não era usado. A alegação do trabalhador foi de que, na empresa, os profissionais eram demitidos após os 60 anos. O Tribunal Superior entendeu que, além da lei, a CLT e a própria Constituição condenam práticas do tipo.

Há no TST a súmula 443, que proíbe demissão por discriminação. O caso concreto é de um trabalhador dispensado após ter contraído HIV, o vírus da Aids.

Para especialistas, a tendência é que essas queixas de práticas discriminatórias persistam, já que a expectativa de vida do brasileiro tem aumentado e o convívio entre gerações é imprescindível. Caberá às empresas ter programas para coibir a prática, diz Priscila.

“Piadas politicamente incorretas, brincadeiras de mau gosto, entre outras condutas inadequadas são adotadas pelos empregados, considerando que eles muitas vezes não respeitam essas diferenças que existem entre eles.”

Se o empregador não interfere após denúncias, pode ser processado.

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Caso recente julgado no TRT-15 (Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região), da região de Campinas (SP), envolvendo uma trabalhadora de 51 anos resultou em condenação da empresa para pagamento de indenização no valor de R$ 10 mil.

Na ação, testemunhas disseram que a funcionária foi vítima de etarismo e assédio moral por parte de algumas pessoas da equipe, e que os superiores foram informados, mas não tomaram atitude e ainda demitiram a trabalhadora. Ela desenvolveu depressão e síndrome do pânico que podem estar ligadas aos episódios. Cabe recurso.

A discriminação ou o assédio podem ser comprovados tanto por prova documental como testemunhal, diz Priscila. “Ou seja, você pode levar alguém como testemunha para demonstrar ter presenciado aquele fato, aquele ato de discriminação, como também por meio de documentos. Exemplos: próprio email, carta, algo nesse sentido.”

Segundo ela, tanto colegas de trabalho quanto superiores podem cometer o ato. “Pode acontecer independentemente do fator hierárquico, ou seja, tanto por superiores como por pares.” A situação deve ser levada ao setor de recursos humanos, mas, se o trabalhador não se sentir confiante ou protegido, pode procurar a Justiça, desde que tenha provas. Áudios e vídeos também podem ser usados.

Decisões contrárias já começam a surgir. No TRT do Rio de Janeiro, o juiz negou a indenização por discriminação por idade, já que havia cláusula específica sobre esse tipo de dispensa no acordo coletivo de trabalho. Prevaleceu o acordado sobre o legislado.

O advogado Ruslan Stuchi, sócio do Stuchi Advogados, diz que esse tipo de prática sempre existiu, mas não era levada à Justiça. Para ele, com a “conscientização” da sociedade, as reclamações trabalhistas crescem.

“Muitos assédios, muitos atos de discriminação não eram reportados ao Poder Judiciário. Então, há um aumento porque as pessoas estão se conscientizando, e o trabalhador está buscando seus direitos mais que antigamente. Antigamente, tinha bullying, a pessoa que sofreu preconceito achava normal ser destratado.”