BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Os ministros de Comércio do G20 firmaram nesta quinta-feira (24) um acordo que estabelece nove princípios genéricos que buscam orientar a formulação e a implementação de medidas relacionadas a comércio e desenvolvimento sustentável.

No documento divulgado após o encontro em Brasília, os líderes falam em uma lista “voluntária”, “não vinculante” e “não exaustiva” como resultado das discussões de um grupo marcado por divergências entre países e blocos.

Direito de regular; ambiente comercial favorável; coerência; base em ciência e evidências de qualidade; transparência e consultas; múltiplas soluções; dimensão de desenvolvimento; transições justas, equitativas e inclusivas; e cooperação internacional são os nove parâmetros acordados.

“As medidas devem ser coerentes e alinhadas com os acordos multilaterais relevantes e outros acordos internacionais ratificados pelas partes”, diz um dos trechos.

Apesar dos termos vagos utilizados nos princípios, os membros da presidência brasileira do G20 comemoraram o resultado como um feito histórico, defendendo se tratar de um documento que servirá de referência para futuras discussões sobre o assunto.

O G20 reúne as 19 maiores economias do mundo, além da União Europeia e da União Africana. Os documentos produzidos pelo grupo de trabalho servirão de subsídio para a declaração de líderes, em novembro, quando se reúnem os presidentes dos países membros no Rio de Janeiro.

A secretária de Comércio Exterior do Mdic (Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), Tatiana Prazeres, que liderou o grupo de trabalho, ressalta que os ministros conseguiram se colocar de acordo em relação às balizas que devem orientar a formulação de políticas relacionadas a desenvolvimento sustentável e ao comércio mundo afora.

“Quando o Brasil propôs essa iniciativa, muitos julgaram que ela seria ambiciosa demais, que não seria possível ter consenso com relação a esse conjunto de princípios, nós mesmos nos perguntamos se seria possível ou não a obtenção de consenso, estamos muito satisfeitos com o resultado, que é histórico”, disse.

Em meio às reuniões técnicas, na última terça (22), Prazeres classificou o processo de construção de consenso como “penoso”. Como exemplo, mencionou princípios de não discriminação no comércio internacional, que não contavam com respaldo de todos os países do G20 por conta de conflitos geopolíticos ou de práticas estatais que geram distorções nas relações comerciais.

“É uma realidade internacional muito complexa, e a ausência de consenso também diz algo sobre o mundo em que nós vivemos. Eu não tomaria o consenso como algo garantido. Longe disso, é um processo realmente muito desafiador, mas o processo em si tem valor”, afirmou ela na ocasião.

Para o embaixador Fernando Pimentel, diretor do departamento de Política Comercial do Ministério das Relações Exteriores, o pacote final reflete força de vontade e comprometimento político dos países de encontrar um meio comum no debate e que os temas precisam ser tratados em conjunto.

“Não é só o Brasil que faz concessões, os países fazem concessões. […] É uma negociação multilateral. Todos os países tiveram que ceder um pouco do que queriam, mas logramos como grupo esse consenso que é bastante relevante”, disse.

Nos bastidores, os negociadores falam em “consenso possível” e, segundo relatos, o acordo mais complicado se deu no eixo que trata de comércio e desenvolvimento sustentável pelas diferenças entre economias avançadas e países em desenvolvimento.

As discussões englobaram a situação complexa do comércio global em um cenário de medidas unilaterais adotadas por algumas nações, de novas regulações sob o argumento de proteção ao meio ambiente e de conflitos geopolíticos.

De acordo com interlocutores a par das discussões, do lado dos países em desenvolvimento, havia a defesa de uma linguagem mais forte contra medidas unilaterais no comércio internacional.

Nas discussões envolvendo políticas ambientais, havia nuances mesmo entre as economias avançadas, com os Estados Unidos se mostrando mais pragmáticos, mas também preocupados com o setor privado, enquanto a União Europeia adotou uma postura mais drástica.

Na abertura da reunião ministerial na manhã desta quinta, o vice-presidente Geraldo Alckmin, que também é ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, disse ser fundamental que “as economias mais avançadas colaborem com o apoio técnico e financeiro para que os países em desenvolvimento possam acompanhar as transições que os tempos atuais exigem, sobretudo para a inclusão social e o enfrentamento da emergência climática.”

Segundo ele, a cooperação internacional é a chave para garantir que nenhum país seja deixado para trás. “O cálculo da pegada de carbono e a eliminação de barreiras unilaterais do comércio são medidas prioritárias que, quando adotadas, permitirão que o comércio e os investimentos sejam motores do desenvolvimento sustentável”, acrescentou.

A presidência brasileira do G20 também estabeleceu outros eixos prioritários no grupo de comércio e investimentos: mulheres e comércio internacional; desenvolvimento sustentável em acordos de investimento; e reforma da OMC (Organização Mundial do Comércio).

Quanto à reestruturação da OMC, Pimentel reconheceu que cabe ao G20 dar apenas um “impulso político”, mas que há uma negociação em andamento em Genebra e que a decisão fica a cargo dos países membros da própria entidade.