IEDA MARCONDES
FOLHAPRESS – Se você não se lembra mais de “Sorria”, sucesso inesperado de 2022, não se preocupe. Nos primeiros minutos da continuação, em cartaz nos cinemas, um personagem explica uma das regras estabelecidas no original. No fim, até o monstro verbaliza a moral da história, caso não tenha ficado claro.
Em “Sorria 2”, Parker Finn retorna como roteirista e diretor e segue a mesma fórmula do primeiro. Na trama, uma maldição é transferida de pessoa para pessoa. Após uma semana infernal, se não houver como deter a entidade, o amaldiçoado morre. É a mesma estrutura de “O Chamado” ou “A Corrente do Mal”.
No terror, fórmulas nem sempre são ruins. Toda a franquia “Premonição”, iniciada há mais de duas décadas, parte da mesma premissa, mas o que vale mesmo são as mortes estrambólicas dos jovens que protagonizam cada filme. Como esquecer daquela tora de madeira atravessando o parabrisa do carro?
Ao optar por um novo grupo de personagens, Finn parece seguir pelo mesmo caminho. Em vez de centrar a trama na irmã ou no noivo da antecessora, o que seria uma solução preguiçosa, agora acompanhamos os sete dias de insanidade de uma diva pop num momento crucial de sua carreira.
Após sofrer um grave acidente de carro, que resultou na morte do seu namorado, a cantora Skye Riley tenta recomeçar. Com uma turnê pela frente, ela precisa ensaiar com os seus dançarinos, mas ainda sente dores nas costas por conta das cirurgias que ela teve de fazer. Ossos, assim como traumas, precisam de tempo algo que ela não tem para serem curados.
Interpretada por Naomi Scott, que também dá voz à trilha sonora, Skye procura um traficante para comprar Vicodin, um potente opioide. Quando chega lá, ele parece estar bem no meio de uma “bad trip”. Lewis, vivido por Lukas Gage, está descontrolado e abre um sorriso sinistro para Skye pouco antes de esmagar o próprio rosto usando uma anilha para musculação.
Em comparação com o original, a grande novidade de “Sorria 2” é a humilhação pública em grande escala. Depois do suicídio brutal de Lewis, Skye passa a ter alucinações e lapsos de memória. E em qualquer lugar que ela vá, há alguém com um celular para registrar e compartilhar o seu constrangimento.
Há dois anos, “Sorria” estava numa intersecção curiosa entre o sisudo terror de trauma, que já dava os seus últimos suspiros, e uma onda nascente de terror farofa, de títulos como “Noites Brutais” ou “Morte Morte Morte”. E sem escolher um lado, “Sorria” tentou contemplar os dois numa espécie de terror isentão.
Desta vez, Finn também aposta no “gore”. Com desfiguramentos e tripas esparramadas pelo asfalto, o diretor parece ter captado, conscientemente ou não, uma outra tendência do gênero. Afinal, para competir com “A Substância” e o vindouro “Terrifier 3”, é preciso aumentar a quantidade de sangue, e agora há orçamento para tal.
Para o espectador calejado, no entanto, não há nada muito aflitivo em “Sorria 2”. Bem no que deveria ser a apoteose, os efeitos digitais não convencem, ao contrário do final estapafúrdio de “A Substância”, que também lida com as pressões da fama. Vários sustinhos fazem o espectador pular na poltrona, mas é mais pelo barulho repentino do que pela tensão acumulada.
Apesar da proposta divertida, que mergulha uma celebridade na própria loucura e explora um entretenimento mais “cringe”, o diretor recorre ao trauma mais uma vez e da maneira mais didática possível. De novo, todas as ideias apresentadas parecem ter saído de obras melhores, como a animação “Perfect Blue”, de Satoshi Kon.
Se a humilhação pública for mesmo o futuro da nova franquia, Finn também já se sujeitou a ela ao aceitar uma nada sutil inserção de uma marca de água em “Sorria 2” ao ponto de a tal garrafa quebrar e seu nome seguir visível num caco de vidro maior. Talvez seja o momento de passar a maldição adiante. No mínimo, para um outro roteirista.
SORRIA 2
– Avaliação Regular
– Quando Em cartaz nos cinemas
– Classificação 18 anos
– Elenco Naomi Scott, Rosemarie DeWitt, Lukas Gage
– Produção Estados Unidos, 2024
– Direção Parker Finn