SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A ONU acusou Israel de invadir uma base da missão de paz das Nações Unidas no Líbano neste domingo (13). Segundo a organização, tanques das Forças Armadas israelenses derrubaram os portões de um posto avançado da Unifil (Força Interina das Nações Unidas no Líbano) em mais um ataque contra os capacetes azuis na região.

Israel bombardeou posições dos soldados da ONU na quinta (10) e na sexta-feira (11) no sul do Líbano, país que invadiu no último dia 30, e feriu cinco capacetes azuis —ações que geraram forte condenação da comunidade internacional.

O Exército israelense negou que tivesse invadido a base propositalmente. Segundo sua versão, os tanques sofreram um ataque do Hezbollah que feriu 25 soldados e, enquanto tentavam fugir, colidiram com a estrutura da Unifil. Israel diz ainda que os veículos utilizaram uma cortina de fumaça para escapar e que não representaram perigo para os capacetes azuis.

Essa versão é incompatível com o relato feito pela Unifil do ocorrido.

Segundo a missão de paz da ONU, os tanques destruíram os portões e entraram na base à força. Militares israelenses teriam ainda conversado com os soldados da Unifil, pedindo que as luzes da base fossem apagadas —não está claro o motivo do pedido; uma das teses seria a ocultação dos tanques.

Ainda segundo os soldados da ONU, os veículos ficaram na base por 45 minutos e só saíram quando a Unifil protestou contra sua presença formalmente por meio de canais diplomáticos. Em seguida, disparos com fumaça foram efetuados (a missão de paz não especifica a autoria), e 15 capacetes azuis tiveram reações adversas mesmo depois de colocar máscaras de gás, incluindo “irritação na pele e reações gastrointestinais”.

A Unifil também disse que, em um incidente no sábado (12), militares de Israel impediram que uma missão logística da ONU fosse concluída.

O primeiro-ministro Binyamin Netanyahu voltou a dizer neste domingo que os soldados da missão de paz da ONU devem se retirar das áreas de combate no Líbano, acrescentando que a presença das tropas no local as torna reféns do Hezbollah.

“Chegou a hora de o senhor retirar a Unifil das fortalezas do Hezbollah e das zonas de combate”, disse Netanyahu em um comunicado endereçado ao secretário-geral da ONU, António Guterres —declarado persona non grata em Israel desde o início do mês por, segundo Tel Aviv, não condenar o Irã após os lançamentos de mísseis contra o Estado judeu no último dia 1º.

“As Forças Armadas de Israel pediram [a retirada da Unifil] repetidas vezes, e receberam repetidas recusas, algo que tem o efeito de dar ao Hezbollah escudos humanos”, disse Netanyahu.

Por meio de seu porta-voz, Guterres reiterou que a Unifil e suas instalações nunca devem ser vistas como alvos militares. “Ataques contra os capacetes azuis são uma violação do direito internacional, incluindo o direito humanitário internacional, e podem constituir um crime de guerra.”

Tel Aviv diz mirar alvos do Hezbollah —no domingo, o ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, acusou o grupo armado libanês de utilizar bases da Unifil “como fachada para suas atividades terroristas”, sem apresentar provas. O Hezbollah nega utilizar instalações da ONU para lançar ataques.

Em conversa com o secretário da Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, Gallant disse que seu país vai continuar tomando medidas para proteger as tropas da ONU no Líbano. Washington é o principal aliado e fiador militar e diplomático de Israel na região. O presidente Joe Biden tem pedido publicamente que Tel Aviv não ataque a Unifil; na prática, porém, segue apoiando o governo Netanyahu mesmo com a invasão do Líbano e a abertura de um novo front na guerra entre o Estado judeu e os grupos apoiados pelo Irã.

Ignorando a pressão internacional, Tel Aviv insiste que a Unifil deve se retirar das zonas de combate —os soldados da missão de paz estão lá com o objetivo de evitar que qualquer um dos dois lados do conflito atravesse a chamada Linha Azul, delimitada pela ONU entre Israel e o Líbano. A força das Nações Unidas se recusa a sair do local, dizendo que a bandeira da ONU “precisa continuar hasteada” na região.

Países que contribuem com militares para a Unifil, principalmente da Europa ocidental, fizeram coro às críticas contra Israel. A Itália falou em possíveis crimes de guerra e disse que não obedecerá ordens de Tel Aviv, e a França convocou o embaixador israelense para dar explicações —um movimento diplomático que expressa grave insatisfação.

No sábado (12), 40 países que contribuem diretamente com a Unifil, incluindo o Brasil, emitiram uma nota condenando os ataques contra a missão de paz sem citar Israel. Assinaram o texto países como Alemanha, Reino Unido, China, Turquia, Itália, França e Espanha.

O Itamaraty também disse em nota na sexta-feira (11) que os ataques de Israel são inaceitáveis e violam o direito internacional, voltando a pedir por um cessar-fogo no Oriente Médio, e o papa Francisco pediu neste domingo respeito aos capacetes azuis no Líbano.

Socorristas da Cruz Vermelha no Líbano também foram feridos por um bombardeio israelense no sul do país. De acordo com a organização, ambulâncias da Cruz Vermelha foram enviadas para resgatar sobreviventes de um ataque aéreo contra uma casa, mas o local foi bombardeado uma segunda vez enquanto trabalhavam, ferindo os profissionais de saúde e danificando as ambulâncias.

Os ataques aéreos de Israel contra posições do Hezbollah no Líbano se intensificaram no domingo. Segundo o jornal The Times of Israel, uma ofensiva com drones deixou ao menos 67 feridos em Binyamina, uma cidade no norte do país, entre Haifa e Tel Aviv.

O Hezbollah diz ter repelido uma tentativa de invasão por terra próximo do vilarejo de Ramia. Foi a primeira vez que a milícia apoiada pelo Irã reportou combates diretos em solo com tropas israelenses desde o início do conflito atual.

Tel Aviv, por sua vez, afirma realizar uma operação limitada no sul do Líbano, e diz ter entrado em “combate corpo a corpo” contra o Hezbollah. As Forças Armadas do país anunciaram ter matado dezenas de combatentes e destruído infraestrutura militar do grupo.

Israel tem repetido que seu objetivo na invasão do Líbano é garantir a volta dos residentes do norte de Israel, fora de casa há meses —a região é o principal alvo de foguetes do grupo armado Hezbollah vindos do outro lado da fronteira.

Até aqui, a invasão de Tel Aviv contra o Líbano já forçou mais de 1,2 milhão de libaneses a deixar seus lares e matou mais de 2.000 pessoas desde o 7 de outubro de 2023, de acordo com Beirute —nove pessoas morreram no sábado depois de bombardeios de Israel, e o país ordenou que civis se retirem de outros 21 povoados no domingo.