BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Com a presença de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), integrantes do governo Lula (PT) e do Congresso Nacional, um evento promovido pelo grupo Esfera Brasil em Roma já resultou em mais de R$ 144 mil em despesas públicas com viagens de autoridades e assessores.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), foi à capital da Itália em aeronave da FAB (Força Aérea Brasileira), acompanhado do colega Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).

Os ministros Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo, e Dias Toffoli também participam do evento. O STF disse que não pagou as passagens e diárias dos magistrados e que os eventuais gastos com segurança serão divulgados no portal da transparência.

A programação do 2º Fórum Esfera Internacional inclui debate com Wesley Batista, acionista do grupo J&F. A JBS, empresa da holding dos irmãos Batista, patrocina o evento.

Wesley e o irmão Joesley Batista foram personagens centrais do escândalo político que ameaçou o mandato de Michel Temer (MDB) em 2017, quando foi veio a público conversa do então presidente gravada por Joesley. Em 2023, Dias Toffoli suspendeu os efeitos do acordo de leniência que a J&F havia assinado com o MPF (Ministério Público Federal).

Os dados disponíveis em portais da transparência mostram que o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, levou dois assessores. As viagens dos auxiliares somam cerca de R$ 60 mil em diárias e passagens.

O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Passos Rodrigues, também participa. A ida de um assessor de Rodrigues custou cerca de R$ 20 mil.

Conforme os normativos que tratam da participação de autoridades brasileiras em agendas internacionais, há previsão de convites para eventos e palestras no exterior sem ônus -ou com ônus parcial, em alguns casos- para a administração pública.

Viagens de membros do Executivo federal podem ser custeadas por terceiros (organismos internacionais, por exemplo). O Senado, por sua vez, prevê a possibilidade de complementar o valor da diária se as despesas com pousada, alimentação e deslocamento urbano custeadas por outros órgãos ou entidades privadas ficarem abaixo do montante previsto.

No caso dos integrantes do Ministério Público Federal, a regra para convites em caráter pessoal e intransferível determina que o custeio seja feito pela entidade organizadora, sem ônus ao MPF. No STF, não há uma norma específica para convites a ministros pagos por agentes privados.

Lewandowski e Pacheco não receberam diárias ou outros pagamentos, segundo as assessorias. O Ministério de Minas e Energia disse que a viagem de Alexandre Silveira, também presente no evento, não terá custos ao governo.

O Ministério da Justiça afirmou que Lewandowski ainda teve agendas com autoridades italianas “para reforçar o combate ao tráfico internacional de drogas”, entre outros encontros, além do fórum promovido pelo grupo Esfera Brasil.

O objetivo do evento é discutir temas envolvendo as relações bilaterais Brasil-Itália e debater os 150 anos da imigração italiana no Brasil. Os participantes também discutem a atração de investimentos, sustentabilidade e transição energética, cooperação na segurança pública, segurança alimentar, impactos da inovação na sociedade e segurança jurídica, segundo a organização.

Procurada, a PF afirmou que os organizadores do evento custearão passagens, em voo comercial, e a hospedagem de Andrei Rodrigues.

“O afastamento do país foi autorizado com ônus de meia diária, referente à alimentação, conforme previsto na legislação”, disse, em nota.

Durante as viagens, afirmou a corporação, o diretor-geral sempre é acompanhado por integrante de sua equipe de segurança, seguindo o que determina a legislação.

A PF disse que, além da participação no encontro promovido pelo grupo Esfera, “estão previstas agendas [de Rodrigues] com autoridades locais”.

Já a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) pagou cerca de R$ 21 mil em viagem do diretor Lucas Lima.

Os portais da transparência ainda registram R$ 15 mil em diárias a dois assessores de Pacheco. O diretor comercial da Infraero, Tiago Chagas Faierstein, foi ao Fórum Esfera Internacional em viagem que custou R$ 28,9 mil.

Presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), Bruno Dantas também participa do evento, em debate marcado para o sábado (12).

Ele já estava na Europa para agendas do tribunal em Paris, incluindo encontro com o secretário-geral da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), Mathias Cormann.

A viagem de Dantas custou R$ 35 mil em diárias internacionais e “adicional de embarque/desembarque”, para o período de 3 a 11 de outubro, segundo a ordem de pagamento emitida pelo tribunal.

Procurado, o TCU afirmou que não houve solicitação de passagens ou diárias de autoridades ou servidores para participação especificamente no Fórum Esfera Internacional.

O chefe do tribunal é casado com Camila Camargo, CEO do Esfera Brasil e filha do presidente do grupo, João Camargo.

Dantas afirmou que os gastos foram para a sua ida ao evento da OCDE em Paris.

O presidente do TCU, além de Pacheco, participam de debate neste sábado com o tema “sinergia para o futuro”, ao lado de Rubens Menin, dono da CNN e da MRV, e de Wesley Batista.

Em nota, o STF disse que Barroso mantém posicionamento favorável sobre a ida de ministros a eventos.

Neste ano, o tribunal pagou R$ 39 mil para um segurança acompanhar Toffoli em viagem que incluiu ida para a final da Champions League, em maio, além de R$ 99,6 mil para eventos realizados semanas antes em Londres e Madri, também com a presença do ministro.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, participa de debate sobre cooperação internacional. Questionada sobre os gastos no evento, a PGR respondeu que “as informações sobre viagens são divulgadas no Portal da Transparência, conforme prevê a legislação sobre o assunto”.

Em nota, a JBS disse que, com 260 mil colaboradores diretos, é “a maior empregadora do Brasil e uma das maiores empresas brasileiras no mundo”.

“De forma transparente, a empresa fomenta, apoia e participa de todos os eventos que tratem do desenvolvimento econômico com outras empresas e autoridades de todos os Poderes nos 17 países onde atua”, afirmou.

O grupo Esfera Brasil não quis responder se pagou despesas das autoridades para participar do evento.

Em nota, afirmou apenas que os eventos são divulgados previamente, transmitidos pelas redes sociais e abertos à imprensa de forma transparente.

“A escolha dos palestrantes e debatedores é realizada pela relevância da autoridade e notoriedade sobre os temas em pauta, sempre em linha com os objetivos da Esfera de promover debates que contribuam para a construção de um país melhor”, disse.

Em nota, a assessoria de Rodrigo Pacheco disse que ele “cumpre agenda oficial no Senado italiano para a troca de iniciativas comuns entre as Casas legislativas” e participa de “seminário para discutir projetos do Legislativo voltados ao desenvolvimento do país”.

A Infraero disse que o fórum terá a presença de empresas do setor aéreo e que será oportunidade de diálogo com o setor. Já a ANTT disse que viagens de servidores “estão vinculadas às atividades do setor de transportes terrestres”.