SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em um trânsito cada vez mais caótico e congestionado, em média, 1.240 veículos zero-quilômetro são emplacados todos os dias na cidade de São Paulo.

Dados obtidos pela reportagem junto do Detran (Departamento de Trânsito) paulista mostram que nos nove primeiros meses deste ano, 339.935 veículos novos receberam emplacamento na cidade.

O número é cerca de 30% maior que no mesmo período de 2023 —com 263.001 unidades— e ultrapassa os 313 mil emplacamentos de todo o ano de 2022.

O percentual de crescimento na capital paulista é o dobro do nacional —levantamento da Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores) mostra que a alta no país foi de 15,9% em 2024 na comparação com os nove primeiros meses de 2023.

Os dados se referem a todos os tipos de veículos motorizados — do total na cidade de São Paulo, 171,5 mil (51%) são automóveis.

Dá para sentir cada vez mais o cheiro de carro novo nas ruas. A lentidão no trânsito passou, também em média, de 331,1 km para 343,3 km, igualmente na comparação do período de janeiro a setembro dos anos de 2023 e 2024, segundo a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego).

Queda no volume de passageiros no transporte coletivo e crescimento no individual, no caso dos serviços por aplicativos com Uber, além de economia em alta, são apontados como fatores que influenciam diretamente na compra de carros e motos.

Pesquisa encomendada pela Rede Nossa São Paulo, realizada pelo Ipec (antigo Ibope) e divulgada no mês passado aponta que passageiros de ônibus, metrô e trem perdem em média duas horas e 47 minutos por dia em seus trajetos, o que significa dez minutos a mais em comparação com 2023.

Os motoristas de carro, no entanto, tiveram alívio: atualmente gastam duas horas e 28 minutos na soma de suas viagens diárias, 18 minutos a menos do que há um ano.

“É preciso parar de perder passageiro do transporte público para o individual ou apenas ficar ampliando faixas”, afirma Ciro Biderman, diretor do FGVCidades, em uma referência a um novo trecho da marginal Pinheiros inaugurado em abril.

Como mostrou a Folha de S.Paulo, a malha de corredores exclusivos de ônibus prometidos de gestão em gestão aos paulistanos ficou praticamente estagnada na última década em São Paulo. Ao mesmo tempo, prefeitos se desdobraram com investimentos bilionários em asfaltamento de ruas.

“Qualquer outra solução que não seja investir em transporte coletivo, com frequência de horários, por exemplo, é tapar o sol com a peneira”, diz Biderman, que defende a cobrança de pedágio urbano para reduzir o uso de carros particulares.

Segundo a própria SPTrans, estatal que gerencia os ônibus do transporte público municipal, queixas de usuários cresceram 29,3% em 2023, em relação ao ano anterior. Ao todo foram registradas 77.254 reclamações, uma média de 211 por dia.

Em nota, a Prefeitura de São Paulo diz que implementou 54 km de faixas exclusivas para ônibus de janeiro até agora, superando assim a meta de 50 km prevista.

“Também estão em andamento obras de novos corredores de ônibus ou de requalificação de já existentes”, afirma a gestão Ricardo Nunes (MDB).

Entre outros, a administração municipal cita como ações para melhorar o trânsito a implantação da faixa azul para motocicletas e a instalação no centro expandido de semáforos inteligentes, que poderão levar a redução, em média, de 20% nos índices de lentidão.

Para Valter Caldana, professor da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo) da Universidade Presbiteriana Mackenzie, mais do que investimento em transporte coletivo, é preciso reorganizar a ocupação do solo, para que o paulistano more mais perto do trabalho e, assim, precise se deslocar menos.

“Tem que melhorar as condições de viagens, que também precisam ser diminuídas”, diz. “As pessoas continuam tendo que buscar soluções mais individuais. É o próprio carro ou outros meios que impliquem no combustível, no pneu ou atinjam a purificação do solo.”

MERCADO AQUECIDO

O aquecimento neste segmento é reflexo de ascensão econômica no país —no mês passado, o Banco Central aumentou a projeção e alta no PIB (Produto Interno Bruto) deste ano de 2,3% para 3,2%.

“Quando a economia está crescendo, o setor automobilístico cresce mais proporcionalmente”, afirma Biderman, do FGVCidades

A alta no percentual de emplacamentos mostra que o mercado de veículos está se estabilizando com um bom volume de vendas, afirmou José Maurício Andreta Jr, presidente da Fenabrave.

Segundo ele, apesar da decisão do Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) de elevar a taxa Selic, o cenário ainda é favorável. “A disponibilidade de recursos para financiamento tem favorecido a venda de automóveis e comerciais leves”, diz.

Vinicius Novaes, diretor de Veículos do Detran-SP, afirma que órgão de trânsito tem trabalhado para acompanhar a demanda aquecida.

“Nossas equipes têm intensificado as ações para otimizar o atendimento e assegurar que os processos de emplacamento ocorram sem interrupções.”

PROMESSAS DE SOLUÇÕES

A Folha questionou os dois candidatos que disputam o segundo turno das eleições para a prefeitura paulistana sobre propostas para o trânsito e para o transporte.

O prefeito Nunes diz que se for reeleito vai implantar mais 200 km de faixa azul para motos, expandir o Aquático SP (barcos) para a represa Guarapiranga, instalar VLT (veículo leve sobre trilhos) no centro histórico e prolongar a marginal Pinheiros.

Guilherme Boulos (PSOL) afirma que, caso eleito, vai priorizar o transporte coletivo, com o objetivo de construir mais de 100 km de corredores de ônibus e revisar contratos com concessionárias para que cumpram regras e garantam qualidade no serviço, além de fortalecer e reestruturar a CET.