BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente Lula (PT) conversou nesta quinta-feira (10) com o ministro José Mucio Monteiro após o titular da Defesa afirmar que questões ideológicas têm impedido o Exército de assinar contrato com uma empresa de Israel.

A conversa, por telefone, foi amigável e não houve reprimenda do presidente, segundo duas pessoas com conhecimento do assunto. O tema foi levantado porque petistas e integrantes do governo Lula intensificaram reclamações contra Mucio pelas declarações.

O ministro da Defesa discursou na terça-feira (8) em evento da CNI (Confederação Nacional da Indústria). Em fala de cerca de oito minutos, Mucio disse que a diplomacia do governo tem atrapalhado negociações das Forças Armadas.

“A questão diplomática interfere na Defesa. Houve agora uma concorrência, uma licitação. Venceram os judeus, o povo de Israel, mas por questões da guerra, o Hamas, os grupos políticos, nós estamos com essa licitação pronta, mas por questões ideológicas não podemos aprovar”, disse Mucio.

O ministro se referia à licitação do Exército vencida pela empresa Elbit Systems, de Israel, para a compra de 36 obuseiros, armamento semelhante a um canhão de longo alcance e precisão usado pela artilharia.

O resultado da licitação foi anunciado em abril. Lula, porém, decidiu suspender a assinatura do contrato devido à guerra no Oriente Médio, que tomou novas proporções com o avanço de Israel contra outros países, como Líbano e Síria.

Integrantes do Palácio do Planalto afirmaram à Folha, sob reserva, que a declaração de Mucio gerou constrangimento no governo. Eles afirmam que o ministro da Defesa jogou para Lula a responsabilidade do imbróglio em discurso televisionado.

O ministro também foi criticado nos bastidores por usar o termo “judeu” para se referir ao povo de Israel. A citação a “questões ideológicas” do governo Lula foi outro ponto mal visto no governo. Uma autoridade do governo disse que o discurso de Mucio se parece com declarações do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

“Não existe no PT nem no governo nada contra judeus”, disse o deputado Carlos Zarattini (PT-SP). “A nossa divergência é em relação à forma como o governo de Israel enfrenta o Hamas, aniquilando 40 mil pessoas. Não temos problemas ideológicos com o povo judeu, não se pode fazer uma mistura dessas.”

Membros da Defesa afirmam que não há mal-estar entre Mucio e autoridades do governo. O ministro tem conversado diariamente com Lula sobre a repatriação de brasileiros no Líbano, e a posição do chefe da Defesa sobre o veto às armas de Israel já era conhecida.

Mesmo criticado no governo e por petistas, Mucio teve o discurso celebrado por empresários presentes no evento e por membros das Forças Armadas. O ministro afirmou a alguns deles que ensaiava a fala dias antes, segundo relato de uma pessoa presente no evento.

A primeira vez que o ministro da Defesa disse publicamente que o veto aos equipamentos israelenses era por questões ideológicas foi em entrevista à Folha em setembro. Mucio já fazia as críticas a integrantes do governo e ao próprio presidente Lula em reuniões.

“Com todo respeito, as pessoas que estão contra são por motivos políticos, ideológicos. Eu estou defendendo o Exército e que a gente tenha oportunidade de dotar o Exército Brasileiro de equipamentos mais modernos”, disse o ministro na entrevista.

“A gente está brigando com uma coisa simples, coisa boba. Não estamos fazendo uma compra gigantesca de Israel […]. Precisava provar que foi o dinheiro dos obuseiros que financiou aquela guerra. Dois obuseiros não movimentam absolutamente nada”, argumentou.