BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Na boleia do seu caminhão Mercedes-Benz, modelo fabricado em 1971, o caminhoneiro Paulo Henrique Oliveira espera, estacionado, para pegar mais uma carga.

Por semana, ele roda cerca de 2.500 quilômetros na região de Goiás, entregando farinha de trigo. O velho caminhão azul ainda dá conta do serviço, garante Oliveira, mas todo ano são cerca de R$ 40 mil gastos em manutenção, isso se nada mais grave acontecer.

“Comprei esse caminhão há quatro anos. Paguei R$ 80 mil, pegando empréstimos em dois bancos e vendendo meu carro. É claro que eu queria ter um caminhão mais novo, para pegar mais serviço. Hoje, tem empresa que não chama a gente, por causa da idade do caminhão”, conta Paulo. “A verdade é que a gente não tem apoio pra isso, não acha recurso, é tudo caro demais. Não dá pra trocar.”

A realidade encarada diariamente por Oliveira, no volante de seu Mercedes-Benz azul, é a mesma vivida por outros 152,4 mil motoristas que circulam pelas estradas brasileiras em caminhões fabricados antes de 1989.

Os ganhos econômicos com a renovação da frota são inúmeros, tanto para o motorista quanto para a logística nacional. Um novo estudo realizado pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT) mediu, porém, os benefícios ambientais da renovação gradual da frota, além do custo desta renovação.

O levantamento, ao qual a Folha teve acesso, mostra que hoje há 1,290 milhão de caminhões rodando pelas estradas, carregando 65% da carga nacional. Desse total, 55% já têm mais de 14 anos de uso, o que significa veículos com tecnologias mais antigas e emissores de um maior volume de poluentes.

O estudo aponta que a troca dos 152 mil caminhões fabricados antes de 1989, por modelos produzidos a partir de 2023, traria uma redução de 33,5% na quantidade de poluentes em relação ao total que é emitido pelo setor. Se isso fosse feito com modelos fabricados entre 2006 e 2011 (286 mil caminhões), essa queda nas emissões chegaria a 70%.

Os veículos pesados fabricados a partir de 2022 reduzem, em média, 95,4% das emissões de gases poluentes na atmosfera, em comparação com os mais antigos.

Além disso, diminuem em 98,3% a emissão do “material particulado”, que é responsável pela fumaça preta, causadora de doenças respiratórias, na comparação com veículos fabricados até 1999. Os ganhos ambientais, portanto, são inquestionáveis. A questão é o custo dessa troca e os instrumentos para fazê-la.

Pelo levantamento, a troca dos 152 mil caminhões mais antigos em atividade custaria R$ 104,8 bilhões. Se esse movimento for ampliado para modelos fabricados até 1999, a cifra já salta para R$ 230,2 bilhões.

Pelos cálculos da CNT, no mundo ideal, se todos os modelos feitos até 2022 fossem atualizados, chega-se ao montante de R$ 1,160 trilhão. A saída, portanto, é escalonar.

O governo federal está em vias de fechar um programa de incentivo à renovação da frota de caminhões. Em julho do ano passado, o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin, testou um programa temporário de incentivos, de apenas quatro meses, que previa de desconto para facilitar a compra de veículos mais sustentáveis, tanto por motoristas autônomos como por pessoas jurídicas.

À Folha, o MDIC declarou que vem debatendo, com a participação de diversos setores, propostas para implementação de um programa de renovação de frota que seja viável e possa se desenvolver continuamente.

“O ministério se pronunciará sobre o programa quando de sua conclusão. Adiantamos que entre os objetivos do programa de renovação de frota estão: aumento da produtividade e eficiência logística, redução de custos operacionais, redução do consumo de combustível, mais segurança nas rodovias, melhoria nas condições de trabalho dos motoristas profissionais e mais sustentabilidade ambiental, com reciclagem de materiais e redução das emissões de CO2”, afirmou.

Segundo Luiz Carlos Moraes, diretor de relações institucionais e comunicação corporativa da Mercedes-Benz do Brasil, o país já conta com uma cadeia potencial para fazer o recolhimento correto de caminhões velhos, separar os tipos de sucata e destinação. O que falta é mostrar de onde vai sair os recursos e em quais condições.

“Essa renovação promove uma economia circular, com mais oportunidades. O desafio é encontrar um recurso que não comprometa o impacto fiscal. O BNDES pode ser um parceiro, para financiar em condições aceitáveis. Sentimos que o governo está sensível à importância disso”, diz Moraes.

O diretor-executivo da CNT, Bruno Batista, afirma que, em países europeus e no Japão, o governo também adota outras estratégias para estimular a troca de caminhões. O valor do IPVA, por exemplo, que no Brasil cai com o passar dos anos, faz o caminho inverso nesses países, aumentando conforme o envelhecimento do veículo. “Isso estimula a troca, incentiva a busca por modelos mais eficientes”, diz.

Antes de receber um IPVA mais caro, o caminhoneiro Adergécio Marques da Silva, o “Dino, de 65 anos, espera que um banco ofereça a ele condições favoráveis para que ele troque seu caminhão fabricado em 1999.

“Se tiver oportunidade, todo mundo muda de caminhão, mas a realidade é difícil. Eu mesmo já desisti de trocar. Na minha idade, nenhum banco quer fazer financiamento. Dizem que posso morrer até os 71 anos”, comenta Dino. “E eu só quero trabalhar.”